A potência da maternidade: Afetos e desafios
- Jéssica Vilacha
- 25 de abr.
- 3 min de leitura
Por Jéssica Vilacha, membra, embaixadora e protagonista da comunidade.
A maternidade é um espaço de complexidade, afetividade e desafios que se desdobram de maneira única para cada mulher.
No coletivo, valorizamos nossas vivências que carregam a ancestralidade, a luta, e o saber feminino construído nas margens da história, onde as mulheres negras sempre foram responsáveis por manter e transmitir os valores, as sabedorias e as memórias de nossos povos.
Mães que, ao mesmo tempo que cuidam e ensinam, também resistem a uma realidade que tenta silenciar suas vozes e apagar suas histórias.
Em nossa roda de escuta “Maternidade singular, experiências e desafios” pudemos nos
acolher, refletir e falar de dores, luto e dificuldades em acessar um lugar que deveria ser
direito de todos. Na nossa troca, a potência das vozes ali representadas por mulheres que
carregam feridas e traumas profundos, em busca de atendimento para seus filhos, rede de
apoio e o simples desabafo da sobrecarga diária receberam o afeto de mães típicas e atípicas.
Ao falar sobre os desafios da maternidade atípica e típica, refletimos sobre como esses
diferentes modos de maternar dialogam com a experiência da mulher negra.
Como encerramento, fizemos a leitura do poema "Foi de mãe todo o meu tesouro" de
Conceição Evaristo que diz:
O cuidado de minha poesia
aprendi foi de mãe,
mulher de pôr reparo nas coisas,
e de assuntar a vida.
Foi de mãe todo o meu tesouro
veio dela todo o meu ganho
mulher sapiência, yabá,
do fogo tirava água
do pranto criava consolo.
Foi de mãe esse meio riso
dado para esconder
alegria inteira
e essa fé desconfiada,
pois, quando se anda descalço
cada dedo olha a estrada.
Foi mãe que me descegou
para os cantos milagreiros da vida
apontando-me o fogo disfarçado
em cinzas e a agulha do
tempo movendo no palheiro.
Foi mãe que me fez sentir
as flores amassadas
debaixo das pedras
os corpos vazios
rente às calçadas
e me ensinou,
insisto, foi ela
a fazer da palavra
artifício
arte e ofício
do meu canto
da minha fala.
A poesia de Evaristo, com suas imagens de cuidado, sabedoria e resiliência, reflete como a
maternidade se materializa como um campo de aprendizagem profunda. Para muitas
mulheres negras, a maternidade não é apenas o nascimento de um filho, mas o nascimento de si mesmas em múltiplas dimensões de vida, como mãe, como mulher e como ser social em um contexto que muitas vezes marginaliza essas identidades.
A maternidade, no contexto afrocentrado, também é uma viagem de autoconhecimento e
revelação. A mãe é aquela que, com sua sabedoria, abre os olhos da filha para o milagre da
vida, mas também para os obstáculos e para as adversidades que precisam ser enfrentadas. A maternidade, muitas vezes, ensina que não é fácil transformar o sofrimento em superação, mas que é possível.
Ao trazermos essa poesia para a roda de escuta sobre os desafios e experiências entre a
maternidade atípica e típica, podemos observar que a experiência materna, carrega uma força ancestral e uma sabedoria que transcendem os desafios do cotidiano. Olhando para a maternidade não só sob o olhar da norma, mas também em suas diversidades, respeitando as diferentes realidades que cada mãe vive. Para nós, ser mãe é também ser resistência, é transformar o sofrimento em potência e cuidar não apenas de seus filhos, mas de toda uma história que precisa ser ouvida e valorizada e nós, assim seguiremos.
UUaauuu, grata por sua escrevivência!